Isso mesmo!!! LICITAÇÕES ESPÚRIAS
No artigo anterior, abordei a conduta das empresas de Engenharia. Lembro que iniciei comentando que as empresas não deveriam ser colocadas na "vala comum", no tocante às práticas de corrupção. Foi falado sobre a necessidade dessas empresas terem gestão baseada em regras de compliance, com o objetivo de estabelecer uma nova cultura de gestão, com práticas, além de legais, legítimas e fundamentadas em princípios éticos. Falei sobre a passividade das empresas em aceitarem e se submeterem a prazos inadequados.
Mas, e as licitações???
Como há a possibilidade de algum leitor deste artigo não ter conhecimento sobre licitações, vou fazer um pequeno resumo.
Licitação é um conjunto de procedimentos administrativos, obrigatório para os governos Federal, Estaduais e Municipais, poderem adquirir produtos ou serviços de entes privados que entram na disputa para realizar esse fornecimento.
As licitações são baseadas num conjunto de legislação, cuja primeira lei foi a Nº 8.666/93. Depois dela vieram algumas alterações, atualizando-a, face a novas necessidades. Tudo começa com a elaboração de um Termo de Referência, o qual define, com base técnica (ao menos deveria!!!) os produtos ou serviços que precisam ser adquiridos. Então é elaborado, por uma Comissão de Licitação, um Edital de Licitação, contendo as exigências legais, técnicas e de documentação. Na maioria dos casos é apresentado, nesse edital, o valor base ou de referência, estabelecido pelo contratante através de consulta ao próprio mercado fornecedor dos produtos ou serviços, ou através de planilhas de referência, orçamentos e composição de custos. Esse edital é publicado para conhecimento público e para as empresas que desejem concorrer, prepararem suas propostas. Depois disso tem uma série de etapas, que não vêm ao caso detalhar aqui.
Mas tem outras informações que são relevantes para o contexto deste artigo. A mais relevante é a questão das Modalidades de Licitação, que estão relacionadas com o processo e limites de valores. São seis: Concorrência, Tomada de Preços, Concurso, Convite, Leilão e Pregão, esse último instituído posteriormente, pela Lei Nº 10.520/2002. Outra legislação importante é a que trata do Regime Diferenciado de Contratações Públicas - RDC, implementado pela Lei Nº12.462/2011.
Além das Modalidades, há a subdivisão das licitações em Tipos de Licitação, os quais estão relacionadas aos critérios de julgamento: Menor Preço, Melhor Técnica, Técnica e Preço, e Maior Lance ou Oferta.
Os serviços de Engenharia, como projetos, estudos, levantamentos e construções de forma geral, eram licitados, de acordo com o valor nas modalidades convite, tomada de preços e concorrência. E, a depender do nível de exigência requerido ou pelo tamanho do serviço, segundo menor preço, melhor técnica ou Técnica e Preço.
Com o advento dos leilões e pregões, presenciais ou eletrônicos, inicialmente não pensados para serviços de Engenharia, surgiu a possibilidade da disputa ser decidida por lances ou ofertas pelos concorrentes. Posteriormente passou-se a licitar também os serviços de Engenharia.
Aí concluo essa breve explicação sobre licitações e passo a abordar situações relacionadas com o título deste arrazoado, que é LICITAÇÕES ESPÚRIAS.
Esse pesado adjetivo para as licitações faço com base em informações acerca de resultados de pregões de serviços de Engenharia. Entendo que o Poder Público deve buscar os menores preços POSSÍVEIS, principalmente pelo fato de que 15 a 20% do Produto Interno Bruto do País é movimentado pelas compras públicas. Mas, no caso da Engenharia, notadamente os serviços que tenham a necessidade de maior conhecimento e experiência técnica, é inadmissível se ter resultados de licitação onde a proposta vencedora é com 40, 50 e até 70% de redução ao preço de referência apresentado no edital de licitação. É INCONCEBÍVEL.
Os órgãos licitantes, por seu turno, ao aceitarem essas reduções aos seus preços de referência estão sendo IRRESPONSÁVEIS, pois está claro que uma empresa que se propõe a fazer por 30% desse preço, ou vai fazer mal feito, ou não vai realizar o serviço. Talvez com sua conivência, ou de seus "responsáveis". Ou ainda, estão tornando pública sua incapacidade de definir esses valores de referência. Ou, quem sabe, provocando questionamentos às tabelas de referência que órgãos emitem periodicamente, como DNIT, DER, URB/Recife etc.
Tribunais de Contas se posicionam favoravelmente aos pregões para serviços de Engenharia, com o argumento da economicidade. Também irresponsabilidade, incompetência ou conivência, pelos mesmos argumentos acima.
O "barato" sai caro. Com as devidas aspas.
As licitações são necessárias para propiciar a condição de uma livre participação, respeitadas as exigências legais, do mercado na oferta de serviços e produtos. Além disso, se prestam à função regulatória desses mercados. Mas nos termos que têm ocorrido essas licitações, não tem como não dizer que são sim, espúrias.
Tudo isso que foi tratado traz consequências graves para a qualidade dos serviços de Engenharia. Compromete a imagem do Poder Público. Compromete as empresas que participam dessa corrida autofágica. E prejudica, acima de tudo, a população.
Essa situação requer uma discussão, com envolvimento de órgãos de governo, do judiciário, de fiscalização/controle, de classe e de profissionais, visando corrigir essa distorção da aplicação da Lei, ou mesmo pela necessidade de mudança da legislação vigente.
Do jeito que está é que não pode ficar!!!